Estou com problemas de adaptação. Sinto-me fora de sintonia. Não consigo acompanhar as rápidas mudanças que esperam de mim.
Com a idade que tenho, já vivi o bastante para presenciar três períodos distintos no comportamento das pessoas.
Na infância, aprendi de meus pais que era preciso ser. Ser honesta, ser educada, ser digna, ser respeitosa, ser amiga, ser leal, ser íntegra, ser verdadeira , ser autêntica, ser sincera…
Com o passar dos anos, fui testemunha da fase do ter. Era preciso ter. Ter boa aparência, ter dinheiro, ter status, ter coisas, ter presença, ter estilo, ter bens, ter influência…
Na atualidade, estou atrapalhada. Olho para os lados e tenho dificuldade para imitar e acompanhar os que estão circulando por aí. Estou embaralhada com a fase do faz de conta.
Pais fazem de conta que educam, fazem de conta que não sabem que seus filhos usam drogas, que se prostituem, que estão se matando aos poucos. Os filhos fazem de conta que não sabem que os pais sabem.
Profissionais fazem de conta que são competentes, governantes fazem de conta que se preocupam com o povo e o povo faz de conta que acredita.
Pessoas fazem de conta que são honestas, líderes religiosos se passam por representantes de Deus, e fiéis fazem de conta que têm fé.
Doentes fazem de conta que têm saúde, criminosos fazem de conta que são dignos e a justiça faz de conta que é imparcial.
Traficantes se passam por cidadãos de bem e consumidores de drogas fazem de conta que não contribuem com esse mercado do crime.
Posso até arranjar desculpas para explicar esse faz de conta, mas não acho justificativas.
Importante salientar, todavia, que essa representação no dia-a-dia, esse faz de conta, causa prejuízos para aqueles que lançam mão desse tipo de comportamento.
A pessoa que age assim termina confundindo a si mesma e caindo num vazio, pois nem ela mesma sabe quem é, de fato, e acaba se traindo em algum momento. E isso é extremamente cansativo e desgastante.
Raras pessoas são realmente autênticas. Por isso elas se destacam nos ambientes em que se movimentam.
São profissionais éticos e competentes, amigos leais, pais zelosos na educação dos filhos, políticos honestos, religiosos fiéis aos ensinos que ministram.
São, enfim, pessoas especiais, descomplicadas, de atitudes simples, mas coerentes e, acima de tudo, fiéis consigo mesmas.
A pessoa que vive de aparências ou finge ser quem não é corre sérios riscos de entrar em depressão. Isso é perfeitamente compreensível, graças à batalha que trava consigo mesma e o desgaste para manter uma realidade falsa.
Se é fácil enganar os outros, é impossível enganar a própria consciência.